quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Auto-de Fé




Ontem conheci um Prof. daqueles que eu gosto. Um Prof. a sério! Leitor de Português em Budapeste, traduziu Imre Kertész, Nobel de Literatura para as nossas delícias turcas de iletrados caminhantes...

Tive a sorte de conhecer um húngaro na minha vida. Falei sempre com o meu chefe em francês... era a nossa "langue coupée" num escritório onde todos falavam alemão. Foi com ele que aprendia a gostar da Hungria, das amantes italianas e das óperas de Vienna. O pai refugiado, veio como médico reumatologista do regente, com o filho mais novo, viver no Estoril, claro! Muitos anos mais tarde na ilha da Madeira fui visitar o mausoléu do último dos Habsburgos. A Europa Central tinha deixado de existir. Ficavam os mortos das duas guerras mundiais e os satélites do império soviético.

O meu chefe, que já era nessa altura um amigo, contou-me uma longa história.... tinha trabalhado na Rádio Europa Livre, tinha sido feito prisioneiro desde a batalha de Budapeste, tinha fugido, e jurou que nunca mais voltava à Hungria... mas voltou muitos anos depois e tempos depois foi prestar a sua homenagem ao último imperador do Império Austro-Húngaro sepultado na ilha da Madeira. A Europa Central sempre foi um mistério para mim. Vienna era o "fin de siécle"! ...Freud, Klimt, Kafka... Elias Cannetti, judeus de todas as nacionalidades e cores. Hiddish e sefarditas.....(Ainda há pouco tempo ofereci antigos selos do Imperador Francisco José com o carimbo da Bosnia-Hersegovina a um a amigo que estava em Belgrado durante os bombardeamentos da Nato). Conheci depois uma versão mais recente das actalidades francesas... Lembro-me de uma noite no Porto. Numa pensão modesta....com rakia e muitos enchidos que não dispensaram as francesinhas para o pequeno almoço... Não dormimos, ou pouco, de manhã fomos apanhar o comboio do Douro. Bebemos umas cervejas para acordar...e no Pinhão...já não me lembro...foi dificil arrancar de lá. O Stefan e a sua mulher sérvia.., opositores de Milosevitsht( Nem eu sabia que o dito Marechal Tito era Croata, nem sonhava com o que se iria passar alguns meses depois... ouvi apenas). Nunca fui aos Balkans...mas tenho um fascinio enorme pela sua história e pelas pessoas que eu conheci por aqueles lados. ... Há poucos tempo, em Marko Turnovo, fui visitar o museu (evidentemente...não existe mais nada para ver por ali) e ouvi falar... vi documentos, fotografias de famílias, dos massacres do levantamento búlgaro contra os turcos. ...A vida é assim... Falei do Kosturica e ninguém achou graça... Quero voltar um dia destes aos Balkans, a Thesalónica com o meu amigo Corto Maltese.... desta vez para falar de coisas mais sérias... É deste império austro-húngaro que eu vi os restos...os versos do Rilke, os massacres nas fronteiras de Trieste....os milhões de mortos e refugiados de sonhos que ainda podiam escrever sem uma decisão judicial em contrário, onde ainda era possível amar nas praias do 28 ( não me lembro do número do vaporetto....)

Nunca fui a Budapeste... mas quero ir! Li o Chico Buarque como todos aqueles que gostam de novidades...mas de repente caiu-me na mão um livro fabuloso, "As velas ardem até ao fim", dum tal Márai Sandor. Fiquei fascinado, quis ler depois outros autores húngaros. Havia um triologia arriscada... Comecei pelo do meio"A Recusa" e depois não parei. Um dia destes vou conhecer Budapeste da mesma maneira como conheci o tal Prof. que vos falei e achei graça ao seu bigode farfalhudo!

Para já fiquei com a Antologia da Poesia Húngara que vou ler e uma dedicatória engraçada.

1 Comments:

Blogger joão said...

É da minha vista, ou este post, está a crescer?

E quanto a mim a crescer bem.
Apanho-te no joaodosalgarves.

fevereiro 06, 2006 10:19 da tarde  

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