sábado, junho 24, 2006

A face é a alma do corpo.



Para além de todos aqueles de que me vou lembrando... conheci há uns anos em casa de um amigo de infância e ainda hoje frequentador habitual dos jantares desta casa, o L. Wittgenstein.
Era um mundial qualquer, casa cheia, queijos e vinho na mesa, "chacun que se governe"...conversa de bola! Não se podia pedir melhor...
Não me lembro do jogo, mas de uma conversa tão estranha e tão interessante com o Ludwig sobre fragmentos que não resisto a reproduzir alguns:
"A solução dos problemas filosóficos pode ser comparada com um presente num conto de fadas: no castelo mágico ele parece encantado mas se olhar para ele do lado de fora à luz do dia não é nada além de um pedaço de ferro ordinário (ou algo do tipo)".
"A linguagem prepara para todo mundo as mesmas armadilhas; ela é uma imensa rede de fáceis e desvios errados. E assim assistimos um homem após outro que anda pelos mesmos caminhos e sabemos com antecedência onde ele se irá desviar para fora, onde caminhará direito sem notar o desvio lateral, etc. etc. O que eu tenho que fazer, é erguer sinais de trânsito em todas as junções onde há desvios errados de modo a auxiliar as pessoas a passar pelos pontos perigosos. "
"O poder da linguagem de fazer tudo parecer o mesmo, que é mais claramente evidente no dicionário e que torna a personificação do tempo possível: algo não menos notável do que poderia ter sido a transformação de constantes lógicas em divindades."
"Eu penso que resumi a minha atitude em relação à filosofia quando disse: a filosofia realmente deveria ser escrita apenas como uma composição poética. Deve, parece-me, ser possível apanhar daí o quanto o meu pensamento pertence ao presente, futuro ou passado. Pois eu estava a revelar-me desse modo como alguém que não pode fazer exatamente o que ele gostaria de ser capaz de fazer."
Não sei quem ganhou o jogo... Deixámos o L. na estação de Cambrigde, onde tinha um quarto alugado, mas com a certeza de que um dia destes nos voltariamos a encontrar! Nem vale a pena dizer que era outro judeu austro-húngaro que combateu na 1ª Grande Guerra pelo Império e na Segunda, já nacionalizado inglês pelas tropas britânicas...
O "Caderno Marron" existe em português e viaja ainda hoje frequentemente entre a Caparica e Lisboa...