quarta-feira, abril 26, 2006

Conta-me estórias daquilo que eu não vi

O rio é enorme e o vento leva-nos à bolina... já estamos perdidos.
Agora , só nos resta voltar ao Cairo ou seguirmos em frente, em busca das suas nascentes.
São muitos os medos e esperanças que levo nesta viagem, mas não somos estrangeiros, ambos estamos empenhados nesta expedição.
A criança perdida somos nós que corremos atrás do objecto prometido e já não nos lembramos da hora do jantar... Não me apetece dizer mais adeus.
As tardes tem sempre sol nos teus olhos.
"Conta-me estórias daquilo que eu não vi..."
(Clã)

A Vida é a arte do encontro...

E asssim passámos mais um 25 de Abril. Com menos cantorias porque as vozes andam mais roucas...mas com o mesmo prazer no abraço. .."Éh companheiro aqui estou..". Novos e velhos...mas que importa isso, hoje que estamos todos juntos...e arrisco... um bocadinho mais sábios. "Trás outro amigo também.." canta depois o Zeca atrás das conversas trocadas.
Estamos mais sózinhos? Sim dizem uns, não dizem outros. Há pessoas que só vejo uma vez por ano no 25 de Abril, mas que tenho a impressão que as conheço desde sempre. Há muita cara nova também...Uns de passagem outros da rede que resiste, e outros que têm mesmo uma alma em forma de quadrado.
"Tanto mar". Havia também gente que só conhecia a festa, pá...E depois começa a haver cada vez mais gente que já nasceu depois do 25 de Abril! E só nos damos conta disso, como dizia o Caetano... quando nos olhamos ao espelho e vêmos o que a vida fez de nós.
Amanhã, o dia em que escrevo já é outro dia.
Mas tenho ainda... o cheiro dos cravos vermelhos espalhado pela casa.

segunda-feira, abril 17, 2006

Senhora do Escrivão

"Eu não estou zangado convosco, Umar bin Abdalallah. Eu gosto do vosso carácter...faz-me lembrar muito o meu próprio pai
-Não há outro Alá além de Alá, e Maomé é o seu Profeta?
- Exactamente. Podeis continuar a dizer isso para vós todo o dia.
- Pois então é melhor morrer livre do que viver escravo."

(Tariq Ali, As sombras da Romãzeira, p.93/94).

O Massacre de Lisboa, Páscoa 1506


Sobre o Lobby israelita e as suas ligações perigosas...http://www.lrb.co.uk/v28/n06/mear01_.html penso que todos podem ficar bem informados se quiserem saber mais sobre o que se passa nesta guerra infame no Iraque!
Mas não quero confundir as duas coisas. Relembrar o FACTO de 4.000 judeus ( ou 2.000 conforme as fontes) terem sido barbaramente assassinados na Páscoa de 1506 não me parece nenhuma heresia... Sobre a discussão sobre se eram portugueses... ou alemães, polacos ou russos não me parece ser também nenhuma razão fundamental para não reflectir sobre um país profundamente marcado por uma cultura sexista, anti-semita e racista.
Este trabalho de reflexão tem sido feito pelo Nuno http://ruadajudiaria.com/ Os comentários do Lutz http://quaseemportugues.blogspot.com/e do João Tunes http://agualisa6.blogs.sapo.pt/ são sérios, assim como algumas respostas que estão lá!
É importante para todos nós e para os mais jovens saberem que nunca fomos aquilo que gostávamos de ter sido... Isto vale para todos! Qualquer dia... a guerra colonial também só durou uns 15 anitos e depois uns militares fizeram o 25 de Abril...
Vou guardar o dia 19 na agenda e vou procurar levar mais uns amigos! Em vez de ficar em casa, vou ao Rossio, onde podemos todos fazer qualquer coisa de interessante para nós e os nossos filhos...Perder a altivez, ter vergonha e recuperar a memória!
Eu estou à vontade, tenho dedicado dias e horas na defesa das tradições e da memória dos arábes do Al Andalus , nos massacre e na escravatura que populações inteiras sofreram durante toda a nossa longa Idade Média. Sobre a questão religiosa estou também à vontade, não sou nem ateu, nem cristão, nem muçulmano nem judeu! Sou dos brancos mais pretos de Lisboa( e acrescentaria... em memória do Vinícius...mais cigano e mais puta).

domingo, abril 16, 2006

"Esta sempre será a minha letra" A. M. Lisboa.


O dia de Páscoa trás sempre uns ovos de chocolate que foram escondidos pelos coelhinhos...Tinha três mails engraçados à minha espera.
Do A. que era uma mistura transbordante de todas as saudades. É para nos tocar e não mais para nos escrevinhar...
Da B. que assinou com um pseudómino secreto.
(Ser o Fokas é um passo garantido para a confusão...). Fiquei baralhado... Seria a deles ou a nossa? Estava grávida quando Jesus foi crucificado ou era simplesmente a amante do irmão?
Ou seria aquela admirávelmente cantada pela Elis?
A terceira era do C. obviamente, tinha um selo do estrangeiro: I wish to know things...I'm getting better, better, bethânia...

Assim regressado a casa em boas condições...foi arrumar a mala... Trazia tantas recordações que se abriu sózinha como se fosse magia... vários "cadáveres esquisistos" (alguns com a letra inconfundível do Hermínio e outros), quando de repente reabro um livro lindíssimo mas em muito mau estado, apesar de ter sido editado em 1988, com duas perguntas a vários escritores:- Qual é a sua perspectiva da poesia portuguesa deste século? - Como situa a sua obra neste contexto?
"O que entendo por qualidade? Neste caso, a marca da inovação no interior da linguagem, no seu ritmo, nas imagens e associações, na experiência que proporciona. A Escrita não se teoriza.Pratica-se!" Y. Centeno.

Há de certeza no Amor um princípio fora da lei! Um sentido irrepreensível do delito, o desprezo pela interdição e um certo gosto pela devastação...Quero continuar a remexer a caixa do tesouro a três a quatro ou a cinco. O Amor como dizia o Aragon é a uma atitude da vida do Homem!

quarta-feira, abril 12, 2006

Bed in


Um dia recebi um livro de um amigo com uma dedicatória "You may say i'm a dreamer but i'm not the only one". Chama-se "O que é o Marxismo". Autor V.I. Ulianov. Era interessante o livro mas não menos a dedicatória. O John Lennon tinha sido alguma vez marxista e eu não tinha percebido nada?
Não, o John era simplesmente um pacifista, um provocador ( que mais tarde entendi que tinha aprendido com a Yoko, essa sim artista plástica) que jubilaria com a queda do Muro de Berlim, gritaria bem alto "Give peace a chance" , seria a favor da legalização de todas as espécies de drogas e certamente estaria connosco todos nas manifestações contra guerra do Iraque.
Isto vem a propósito de um tema de jornal que achei engraçado. Tinham finalmente descoberto um manuscrito gnóstico do século II, um tal "Testamento de Judas". Afinal o gajo até era "alegrista" dirão alguns mal intencionados. Como não sou, nem cristão nem católico, não acredito no credo, da virgem e da ressureição, este assunto pelo meu lado estaria terminado. Quero lá saber do Judas e de Jesus. Mas não é assim...Somos aquilo que vamos fazemos mas somos também aquilo que nos fazem crêr. É que o meu filho anda impressionado com esta descoberta e veio-me perguntar o que é que eu achava. Ele sabe que eu tenho um enorme respeito por todas as religiões apesar da não ser crente... e de vez em quando digo mesmo umas heresias!
Tenho é menos respeito pelas opiniões do senhor V. I. ULianov que escreveu esse livrinho, mas que não é muito diferente dos livrinhos que os meninos usavam na catequese...
A Revolução Russa foi sempre um tema de debates inesgotáveis... Ma não se falava dos sovietes de Turin, de Budapeste ou de Berlim. Tinham sido operações falhadas. Os fascistas tinham simplesmente assassinado a Rosa Luxemburgo e os amigos...era melhor esquecer esses acontecimentos trágicos. Temas marginais para dias melhores...
O Fascismo e a Guerra Colonial eram o inimigo principal. Nisso estavamos todos de acordo. Felizmente aconteceu o 25 de Abril de 1974 em Portugal. Feito por militares, milicianos, grande parte oriundos de boa cepa...tudo bem. O 1º de Maio de 1974 foi um momento inesquecível para todos. Depois é que se complicaram as coisas... e muito. De tal forma que passado um ano a tal, a Revolução tinha terminado. Hierarquias militares estabilizadas, respeito pela Constituição e respeito pelos resultados eleitorais.
Foi uma boa altura em 1975 fazer uns meses de serviço (in)cívico mas para conhecer outras realidades.
No ano seguinte entrado na Fac de Direito e depois de muita confusão pelo meio, a minha opcção foi namorar, fazer um "bed in".
A discussão sobre o Marxismo, da maneira como era tratada como um credo de facto nunca me interessou. Tinha mais simpatia pelo Trotsky (que conhecia a biografia fabulosa do Isaac Deutscher, que um amigo, daqueles a sério me ofereceu o primeiro volume), no dia da morte do meu avô... esse sim chamava-se Jesus!) do que pelo Lenine. Do Estaline nem com iscas e depois de um verão na ilha do Farol e de folhear o livro vermelho do grande timoneiro, fiquei com mais curiosidade de conhecer o Nietsche e o "Assim falava Zaratrusta", acabando de vez por me tornar no que sou. Só comprei as obras escolhidas do V. I. Ulianov muitos anos mais tarde...
Depois de algumas discussões acessas com alguns amigos rompi, definitivamente com o centralismo "democrático" e começei a recusar as verdades feitas. Mudei de faculdade, de namorada e começei a trabalhar sobre outros temas.
Confesso que a música sempre me fascinou mas mal sabia arranhar um instrumento. Mas serviu para numa cadeira sobre ideologias e mentalidades fazer um trabalho sobre a "Beat generation e o movimento Hippie! e o Maio de 68...e mais tarde a Bossa Nova.
Foi verdadeiramente a descoberta ....que pode haver uma praia debaixo do alcatrão!
Sou portanto um verdadeiro intelectual burguês de fachada socialista.
Por isso não sou anti-americano porque adoro a cultura americana, o que é diferente de ser anti-Bush. Por isso tenho um profundo respeito por alguns autores judeus, mas não pelo pensamento judeu...and so on...
Adoro uma discussão inteligente nem que tenha que fazer "o papel do diabo" e, tenho amigos de várias cores e feitios que me enchem a cabeça! Pertenço aquela geração que tanto vota num ou noutro partido de esquerda. E foi por isso que resolvi apoiar, um poeta para presidente! Não tenho nada contra os outros, mas aquele... gostava de o cantar! E ainda bem.. porque as causas também fazem novas amizades e só estamos verdadeiramente velhos como escrevia o Mia Couto quando perdemos a capacidade de fazer novos amigos!
Vou levar a biografia do Mao para a ilha do Farol onde vou estar alguns dias com a Elsa e o João até à Páscoa. 30 anos depois do livro vermelho, mas esta escrita pela Jung Chang ( a dos Cisnes Selvagens) . A minha filha telefonou-me depois de ter prometido jantar comigo desde a semana passada! Estou contente.

PS: Levo também o Peter Gay "O século de Schnitzler" comigo, não vá haver algum problema com esta leitura e porque gosto de andar com com os Eyes wide open!

terça-feira, abril 11, 2006

Eles sabem o que fazem!

Ontem chamaram-me a atenção sobre as viagens... Passei longas horas na minha adolescência a ler Jules Verne e o Emilio Salgari.
Foi certamente com eles que começei a aprender a viajar. Mais tarde o João chamou-me a atenção sobre o que estava a passar no jornal Tintin (outra leitura semanal obrigatória)... estavam a começar a editar "A balada do mar salgado", uma prancha a preto e branco, com um traço verdadeiramente original. Foi aí que conheci o Corto Maltese e nunca mais me separei dele . "La maison dorée" (... de Samarcanda) é uma homenagem ao Hugo Pratt, do prazer de não ter sido totalmente inútil ao ter contribuído para que toda uma geração aprendesse a voar....Um dos seus livros mais ousados aliás é a história do Antoine de St Exupéry. ..Uma "amiga" comentava outro dia no seu cantinho: "éramos nessa altura quase escandalosamente felizes..."
A viagem é pois na sua definição isto: fazer a mala e pôr-se a caminho...
Quando regressei no ano passado ao México, não sai do sofá de casa da Dulcineia. Foi apenas através de uma noite com dois amigos, já todos bem bebidos (todos), que me chamaram a atenção para a importância da escrita do Juan Rulfo...um deles conseguiu realizar o seu sonho...a outra esteve a cumprir prazos, simplesmente a trabalhar...
Começei este blog um bocado desalinhado... alegre, apátrida. Por aqui tem passado algumas reflexões que sobre um papel ficariam provavelmente perdidas.
Mas o post de hoje, não tem nada a ver com isso. Tem a ver com um fenómeno perigoso que se passa agora em Itália. Até ontem não se sabia quem tinha ganho as eleições... A direita ainda hoje mesmo recusa reconhecer uma derrota sem uma recontagem dos votos. Uma direita claramente anti-democrática, tão colada ao poder que nunca acreditou que alguma vez mais pudesse perder qualquer eleição! É impossível falar de ética... já tinha escrito o Wittigenstein.
Acho que foi o Stefan Zweig que comentava em tom jocoso a chegada dos fascistas ao poder...
O Eloy, tal como o Casimiro que tem as orelhas transformadas em radar...escreve também sobre a Itália. Vale a pena ler o que diz o Insignificante sobre estas eleições italianas! Pelo meu lado vou continuar a seguir atento os proximos capítulos desta verdadeira novela. E só desejo boa noite a todos e boa sorte Itália!

segunda-feira, abril 10, 2006

Le Rêve Mexican


Um dia sem perceber muito bem aterrei na Cidade do México. Nunca imaginei um local tão extraordinário. Uma cratera imensa rodeada por algumas montanhas de neve eterna."Under the vulcano"que nunca li nem vi. Nunca vi também tantos guardas armados na minha vida. Mas era normal. No México anda-se de guarda-costas e há gajos armados por todo o lado!
Sabia do dia dos mortos, do mescal e do D. Juan. O Castanheda tinha pertencido à minha "Beat generation"!Seriam os cogumelos mesmo mágicos?
Já tinha ouvido também falar do Octavio Paz e de "o labirinto da solidão"(que ainda possuo uma versão velhinha da Gallimard...) através do Hermínio. Amigo e editor do único portugues que escrevia crónicas do México sem nunca lá ter posto os pés.... o poeta que ando há anos para conhecer, o José Agostinho Baptista.
Andei lá uns cinco dias e jurei voltar de novo um dia à minha maneira!
Do México até Paris vim a sonhar com o Zapata e o Sancho Villa. Comprei a biografia do Moctezuma e "le Méxique insurgé", aquele John Reed também não falhava uma... Só faltava o Hugo Pratt...por alguma razão o Corto Maltese, aliás como eu também, tinha as suas raizes mais localizadas na Bahia e em Buenos Aires.
Depois mais tarde em Lisboa, descobri diversas Tequillas e todas as Margaritas da época...o Trotsky, a Frida e os muralistas claro... o Orozco, o Rivera e o Siqueiros.
No ano passado voltei a reencontrar o México. Conheci os livros do Juan Rulfo e depois dois doidos que de maneiras diferentes se tinham apaixonado ambos pelo México! Um deles pegou no avião e lá foi por algumas semanas que pelo que sei, ainda andam a ser digeridas.
Deuses que vinham do Mar... e que hoje chegam do Céu.
Um dia destes, dê por onde dê, tenho que lá voltar!

Questões de Identidade

Já mudei de casa muitas vezes e como podem imaginar amontoei montanhas de chaves que não servem para nada. O mesmo se passou com os livros e com os discos. Não sei mais onde estão e quem ficou com eles. De vez enquando lá os descubro um ou outro entalado entre outros dois que não têm nada a ver um com o outro. Depois tem aquela cena de beber uns copos e emprestar tudo aos amigos. Uns que sabemos que voltam...outros que inevitávelmente desaparecem para quase todo o sempre. É assim a vida. E com os anos o assunto tem-se agravado significativamente!
Mas como sou relativamente arrumado com as minhas coisas, sei por exemplo que dificilmente "O preto de coração branco" não pode estar ao lado dos livros sobre Direito (que não são meus...) nem junto dos de História medieval. Mas nada garante que esteja nos romances na poesia ou no Brasil.
Isto para variar, ou como diria a Y.C. para falar sempre da mesma coisa. Trata-se sem dúvida, de um problema trágico. No Édipo Rei, Sófocles torna bem claro que Édipo cometeu esse crime odioso com toda a inocência. Não sabia que o ancião que o desafiou, e que ele acabou por matar , era o seu pai. Não sabia que a mulher, com quem acabou por casar era a sua mãe.
O problema será pior entendido se for apresentado como um caso de culpa colectiva. Não se trata de acusar um povo em particular, neste caso os Alemães do genocídio organizado perpetuado pelos nazis. Mas não podemos esquecer que essa mesma sociedade nasceu da anterior. Existe ou não existe uma continuidade na tradição dos comportamentos ?.
Mas não me venham agora com essa do "reptiliano" para tentar explicar o Holocausto ou o terrorismo da R.A.F. dos Baader/Meinhof. A sociedade alemã tem sabido produzir do melhor e do pior que a humanidade contemporânea assistiu. Mas existe uma pergunta por responder...para além do bem e do mal...quem são estes alemães do século XXI? Da mesma forma que o Roberto DaMatta perguntava: O que faz o Brasil ser brasil?
São estes os temas que tenho procurado entender fora das leituras tradicionais.
Quando for velho...hoje a crónica do Lobo Antunes da visão de quinta-feira estava particularmente inspirada, quero, como o Vinícius que escrevia numa carta ao Carlos Heitor Cony: "Se encontrar algum erro , corrija, porque eu sou um péssimo revisor. E vamos nos ver qualquer hora para peidarmos juntos, como dizem os gaúchos. Com Uísque, é claro!"

Aquele abraço da terrra que continua a girar porque vou mas é tratar do meu jantar.

sábado, abril 08, 2006

Todos diferentes todos iguais!

Os mortos são aqueles a quem se sobreviveu dizia Elias Canetti, de quem já falei en passant a propósito da minha visita a Toledo. E a crença na continuidade da vida é defendida por quase todas as religiões. Nalguns povos o culto dos mortos transformou-se num culto dos antepassados. É sobretudo naqueles povos que souberam domar os seus mortos, onde o culto é practicado sem mais mistérios, em festa familiar ou mesmo pública. Na Finlândia, durante o inverno sem dia, o passeio ao cemitério é um acontecimento absolutamente normal. No meio das campas cobertas pela neve acendem-se milhares de velas, vão-se recordando os familiares e bebendo café, vinho quente e vodka para festejar com os mortos a aliança que os transforma em aliados. Não há fantasmas à solta na Finlândia, como também não existem no Brasil como já aqui falei. Apesar do calor, as pessoas choram livremente os seus mortos, acompanham-os em multidões até aos cemitérios onde, passam quase automáticamente a heróis.
Elias Cannetti é practicamente desconhecido, como escritor, como pensador, da maior parte dos meus amigos (apesar de ter sido um Nobel em 1981) mesmo daqueles que são meio judeuscomo o António, ou meio arábes, como todos por aqui somos um pouco.... O álbum fotobiográfico que trouxe de Espanha é fantástico. As memórias de Canetti, nascido na actual Bulgária de uma família de pais sefarditas. Viveu em Vienna, após a morte do pai (onde conheu Alma Mahler e a sua filha Manon Gropius a quem Alban Berg dedicou uma das suas peças mais belas para violino"À memória de um anjo"). Morreu em Zurique em 1994 com oitenta e nove anos.
O Alemão foi a língua escolhida de que nunca mais se separou. Existem traduções em todas as línguas da sua obra maior. Em Portugal, tirando o seu romance maior, "Auto-de-fé", publicado pela Livros do Brasil e esgotado há mais de de 15 anos, existem traduções brasileiras das suas memórias e do seu grande ensaio "Massa e poder", que para além de ser uma excelente prosa literária, que mostra uma imensa cultura iluminista, é um dos mais importantes ensaios "não dogmáticos" e "radicais" que li sobre adesão das massas e ascenção do nazi-fascismo... Obviamente escrito no exílio.
Canetti passou mais de trinta anos para tentar decifrar as raízes mais profundas do totalitarismo (apesar da expressão ser mais da Hannah Arendt, a quem num destes dias "alemães" vou também dedicar um post).
Falo de Canetti e da sua obra porque sempre me chocou a morte quase desejada e gratuita de tantos escritores e intelectuais judeus que não suportaram sobreviver ao Holocausto. Uma morte organizada dos seus familiares, amigos e companheiros cuja lista é enorme.
Hoje vamos todos encontra-nos na Mãe Preta, com filhos e tudo...vamos discutir certamente os mesmos temas de sempre. A Amizade, a solidariedade e sobretudo a diferença... como alguém me escreveu...nada para além dos Homems!

sexta-feira, abril 07, 2006

Propostas


...Mas depois, eles sobem, trepam no furor da primeira posse, fumam no interregno, depois as carícias voltam, Gal dá-lhe uma tremenda lição de erotismo periférico e é na segunda trepada que ela retorna, a intervalos, a canção:"Me beije, me beije, me beije, me beije...Me faça um carinho e depois me maltrate. Me morda, me bata, meu amo e senhore depois me brinque, me coisa e de novo. Me beije na boca. Me beije onde eu fiquei mais triste e mais louca. E depois me lave, me lave de amor (ou:E depois me lave, me banhe de amor)."

Carta de Vinícius para Chico Buarque

O que é

É um disparate
diz a razão
É o que é
diz o amor

É um azar
diz o calculismo
É nada senão dor
diz o medo
É sem hipótese
diz a consciência
É o que é
diz o amor

É ridículo
diz o orgulho
É leviano
diz a cautela
É impossível
diz a experiência
É o que é
diz o amor

Erich Fried

B'Leza

quinta-feira, abril 06, 2006

...eu quero que você venha comigo

AGORA FALANDO SÉRIO!

Segundo um critério funcional: os nossos verdadeiros parentes são aqueles que nos ajudam e a quem ajudamos. Existem certamente algumas tensões internas..., muito presentes em culturas familiares, muito presentes nos meios populares e particularmente entre indivíduos em via de ascenção social.

in Análise semanal, Nº1063, Lisboa, 0710406.

quarta-feira, abril 05, 2006

Ansiedade e dúvidas

Ulrike Meinhof foi encontrada morta na sua cela de número 719 na prisão de Stuttgart-Stammheim. A ex-jornalista, que se tornara a inimiga número um, do Estado Federal Alemão, enforcara-se na grade da janela com as tiras de una toalha. Ulrike Meinhof näo deixou nenhuma carta de despedida aos seus companheiros de prisäo, (os militantes da RAF /Andreas Baader, Gudrun Ensslin, Jan-Carl Raspe e Irmgard Möller) ou às suas filhas com13 anos. Este facto foi interpretado por uma comissäo internacional de inquérito com um indício de que a sua morte näo teria sido suicídio. No enterro de Ulrike Meinhof, a 16 de maio de 1976, no bairro de Mariendorf (Berlim Ocidental), o editor Klaus Wagenbach disse que ela "sucumbiu às circunstáncias alemas".Morreu "a mulher mais importante na história da Alemanha, desde Rosa Luxemburgo (1870-1919)", declarou o poeta Erich Fried.

anxiety & doubt

don't doubt of
someone who's saying
he's anxious

but be anxious of someone
who's saying
he's without a doubt

Erich Fried

terça-feira, abril 04, 2006

Reflecting Area Liberation

Sobre uma fotografia de Pedro Dias
tirada com uma caixa de bolachas, no final do século passado.

Neste preciso momento desapareceu da primeira página do O "Publico" na Net a notícia da condenação de um pai que violava reiteradamente as duas filhas menores. Levou doze anos de prisão. A notícia era claramente incorrecta. Qual é afinal a pena para um violador de corpos e de almas?

Faz 30 anos que a terrorista Ulrike Meinhof foi encontrada morta na sua cela.
...Será investigada a relação entre uma biografia periférica e uma identidade cultural baseada na língua e no público( alemão), por um lado, e, por outro, as dimensões críticas de obras construídas numa dupla perspectiva que integra uma distância social e espacial e uma identificação discursiva."
As conversas entre os terroristas e seus advogados eram gravadas secretamente e os terroristas presos teriam recebido pacotes de cordas, com a sugestão de que se enforcassem. O atual ministro do Interior da Alemanha, Otto Schily, na época advogado de defesa dos terroristas da RAF, declarou em 1995, que "nunca teria imaginado que algo assim fosse possível na Alemanha".

"Who's ever quoting authorities is using his memory but not his mind. Vou tentar aprender a lição que a Y. C me transmitiu!

Remember finally
Get away from the authorities!
BE FREE!